Aqui minha resposta ao texto/manifesto do Pedro Cardoso:
"Caro Pedro Cardoso,
Seu texto é interessante e pode provocar reflexões pertinentes ao momento atual, mas faço as minhas ressalvas:
1.Generalizar o problema da pornografia a todo ato de nudez me parece danoso, demasiado cristão e fechado quanto ao pensamento sobre o corpo e suas possibilidades ético-estéticas. Sugiro que você faça distinções mais rigorosas sobre o que seria a pornografia e a nudez “artística”, sabendo que a dimensão voyeuristica é inata ao homem.
2. Afirmar que arte não deve produzir sensações mas sim pensamentos é (no mínimo) uma enorme bobagem. Uma vez que vc valoriza o pensamento em detrimento da experiência sensorial. O que é pena e leviano: sabemos que a sensação vive no pensamento e vice-versa. Vindo de um artista da cena, suas afirmações me parecem ainda mais infelizes.
3. Em seus argumentos o Sr. me sugere ter medo do Corpo, como se este guardasse algo que precisa ser escondido. Pois afirmo que é verdade que a dimensão "demoníaca" existe "encarnada" em nós, e (felizmente) é através dela que gozamos da imanência na pele. Trata-se de uma questão de naturalidade em relação à nossos corpos (o que somos feitos). É fato que as crianças andam nuas e não se assustam tão facilmente quando vêem corpos nús. Tudo depende da educação e de interesses, seja na utilização da nudez seja na sua observação. Acho mais é que os artistas deviam cair na dança, "descobrindo" visões sobre nossos corpos, sem medo.
4.Situar a responsabilidade desta violência ao ofício dos atores nos diretores, produtores e roteiristas nada mais é do que se fazer de vítima, o que não me parece uma posição muito interessante. Ao meu ver os atores e atrizes que jogam este jogo aceitam as suas regras. Pagam o preço da visibilidade e permanência nesta corte mass-mídia. Falar o que você fala desde dentro deste sistema me leva a pensar que você compactua com esta lógica. Lógica esta que não se restringe apenas à utilização ou não de cenas eróticas, trata-se de algo que vem de mais longe e que vai mais além. Atravessa todos os conteúdos presentes na produção destes meios. E são todos políticos, em sua dimensão de discurso hegemônico, carregando interesses e visões de mundo sobre todas as esferas da sociedade.
5. Não posso negar a existência de uma “ditadura da bunda” no Brasil, ironicamente surgimos da nudez desinteressada indígena e hoje chegamos nesta mercância desenfreada do corpo. Isto que valoriza-desvaloriza o que temos de mais essencial: pele, ossos, músculos e nervos. Regida por leis (interesses) de lucro, nossa sociedade se agita sob o signo da exploração (classista, sexista, racista). Estas leis sim é que são pornográficas.
Para concluir, teu texto me parece apontar apenas um sintoma vísivel de toda esta lógica sem nunca atingir seu ponto mais essencial.
Ah, acharia muito mais potente caso vc, no Cinema Odeon, tivesse lido teu texto nú. Despido dos medos de usar seu corpo como manifesto, atravessaria a fronteira entre ficção e realidade mais naturalmente, oferecendo assim uma reveladora ambigüidade. E como diz o Manifesto Antropofágico: “o que atropelava a verdade era a roupa, o impermeável entre o mundo interior e o mundo exterior. A reação contra o homem vestido. O cinema americano informará.”
Saudações"
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